O Uso de Leveduras Encapsuladas na Espumantização: O Verdadeiro Sinônimo de Praticidade Enológica
Em algum momento você já deve ter lido ou escutado falar sobre a fascinante história que há por detrás de uma das bebidas mais apreciadas no mundo a fora: o espumante e/ou champagne. Este vinho, de carbonatação natural, nasceu na imponente região de Champagne (França) de forma “acidental”. De acordo com as informações que sustentam este acontecimento histórico na França, alguns vinhos elaborados naquela região, eram engarrafados antes do término dos processos fermentativos, ou seja, com resíduos de açúcares que davam continuidade na fermentação. Devido a pequena capacidade dessas garrafas suportarem tanta pressão, elas acabavam estourando.
Esta famosa descoberta do século XVII, foi feita por Dom Pérignon, um monge religioso que que era o responsável pelas adegas da Abadia de Hautvilleres, na diocese de Reims (França). Acompanhando os relatos de diferentes vinicultores e procurando uma forma de diminuir os prejuízos que estes produtores relatavam, Dom Pérignon então experimentou garrafas mais resistentes e utilizou rolhas amarradas com arame, conseguindo obter a segunda fermentação dentro da própria garrafa. Com o aprimoramento da técnica, a fermentação passou a ser controlada por açúcares e fermentos, conseguindo, assim, um controle sobre a sua efervescência, o que garantira um produto mais agradável ao paladar. (ABE, 2024)
Apesar do sucesso com o aperfeiçoamento das técnicas para garantir o aprisionamento seguro do gás carbônico da bebida, ainda era preciso encontrar uma forma para a retirada dos resíduos da segunda fermentação que permaneciam na garrafa, o que a tornava turva. Foi então, neste meio tempo, que surgiu um grande nome na vinicultura: a chamada Viúve Clicquot. Esta mulher contribuiu maciçamente para o aprimoramento do champagne, criando os pupitres e inventando as técnicas de remuage (girar as garrafas) e degorgemènt (degola das garrafas a partir do congelamento do bico). (ABE, 2024)
Nesta vasta atmosfera que envolve tal bebida, é importante ressaltar que a denominação champagne é uma Appellation Dorigine Contrôlée (Denominação de Origem Controlada). A região de Champagne, na França, é a única no mundo que pode dar o nome de champagne aos seus espumantes, pois é uma localidade com características edafoclimáticas específicas que originam uvas aptas para essa produção (Chardonnay, Pinot Noir e Pinot Meunier). O vinho elaborado com essas características, em outros países, recebe a denominação de vinho espumante, todavia, no Brasil, existe uma determinada vinícola que pode utilizar esta nomenclatura ao seu espumante por condições legais.
Tradicionalmente para que aconteça a tomada de espuma/segunda fermentação, é feita a adição do chamado “licor de tirage”, nada mais do que a mistura de açúcar e levedura. Na sequência, este licor é adicionado no vinho base e, após a homogeneização, este base é engarrafado para que ocorra a espumantização, originando, assim, o exaltado “método champenoise” ou “tradicional”. É de suma importância destacar que, obrigatoriamente, só poderá ser nomeado “champenoise” ou “tradicional”, os espumantes cuja a segunda fermentação aconteça dentro da própria garrafa, caso contrário, onde essa tomada de espuma venha ocorrer dentro de tanques autoclaves, a classificação do produto deverá ser “método charmat”.
Desde os primeiros aperfeiçoamentos tecnológicos na elaboração desta bebida, ainda com os protagonistas da história, Dom Pérignon e Viúve Clicquot, já era notório que a repercussão do espumante e/ou champange, ganharia um espaço cada vez mais consolidado no mundo vitivinícola. Atualmente, frente ao expressivo crescimento que continua acontecendo no setor, diversas áreas biotecnológicas investem grandemente em insumos que visam garantir qualidade e praticidade para a produção de espumantes.
Tratando-se de inovação, sabe-se que essa palavra está codificada no DNA da vinícola Guatambu, logo, ela tornou-se uma das empresas pioneiras no uso de um grande salto tecnológico desenvolvido pela biotecnologia: as leveduras encapsuladas. Estas leveduras são envolvidas por alginato (polissacarídeo natural extraído de algas) que são utilizadas para a realização da segunda fermentação em garrafa, substituindo o “licor de tirage” e permitindo eliminar a etapa de “reumuage”. Após a introdução na garrafa, essas leveduras realizarão as respectivas etapas fermentativas dentro da cápsula, onde irão permanecer até o final do processo. Ao finalizarem a fermentação, basta inverter a garrafa e retirá-las, sem turvar o produto.
Um outro ponto importante nessa técnica, é que a encapsulação ou imobilização de leveduras, não impede o processo de autólise e subsequente envelhecimento do vinho. (BENUCCI et al., 2019 apud POHL, 2023). Ainda nesta mesma linhagem de benefícios, a Proenol® (Empresa de Biotecnologia em Canelas – Portugal), afirma que o uso desse tipo de leveduras, reduz a contaminação microbiológica, oxidação da cor e perda de aromas. Com isso, a resposta rápida às demandas do mercado e o planejamento eficaz das expedições são facilitados, fazendo com que os produtos cheguem mais rápido ao consumidor.
Pensando neste viés mercadológico, a Vinícola Guatambu adotou este formato de espumantização para um dos seus espumantes mais apreciados pelos consumidores: o Brut Rosé Guatambu. Um produto elaborado a partir de um corte atípico, unindo as uvas Pinot Noir e Gewürztraminer. Esta união gera um espumante de pérlage elegante, com notas delicadas de frutas vermelhas, como morango e cereja, além de um sútil toque de pão tostado, o qual surge por decorrência da autólise. Em boca é de acidez marcante, untuoso, preenchendo o paladar como um mousse. O retrogosto é persistente, refrescante, com notas frutadas e sutis toques do rápido envelhecimento, um belo exemplar de espumante da Campanha Gaúcha produzido a partir do uso de leveduras encapsuladas.
Dado isso, fica o convite para quem quiser vir apreciar os espumantes elaborados por aqui, principalmente este onde esta técnica é adotada. Quem sabe assim, concordar-se-á com a frase dita por Dom Pérignon durante as suas descobertas: “Parece que estou bebendo estrelas.” Por que não vir bebê-las enquanto o Pampa Gaúcho abraça-te? Saúde!
Por: Enólogo Jean Alves